quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

A harpa

A harpa é lírica. Ornamentada.
Mas se mãos indignas a tocam ela é ferida.
Se torna infecunda. A harpa se torna real.

E sendo real perde a virgindade
e soberania de objeto divino.

Caio A. Leite - 17/06/2010

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Paralelas

Quando as vidas tornam-se paralelas não há como se econtrarem novamente. Só se cruzaram se um dia chegaram ao infinito hipotético, pois é lá que os paralelos se encontram. Caso contrário, serão sempre duas retas como as marcas dos pneus na água das ruas, sofrendo por jamais poderem se entrecortarem, sem se amarem e sem conseguir ser um o infinito do outro.


Paralelas

Composição: Belchior

Dentro do carro,
sobre o trevo, a cem por hora,
o meu amor
Só tens agora os carinhos do motor
E no escritório onde eu trabalho
e fico rico quanto mais eu multiplico,
diminui o meu amor...
Em cada luz de mercúrio, vejo a luz do teu olhar
Passas praças, viadutos,
nem te lembras de voltar,
de voltar, de voltar...
No corcovado quem abre os braços, sou eu
Copacabana esta semana, o mar, sou eu
e as borboletas do que fui pousam demais
por entre as flores do asfalto em que tu vais...

E as paralelas dos pneus n'água das ruas
São duas estradas nuas
em que foges do que é teu
No apartamento, oitavo andar, abro a vidraça e grito
quando o carro passa:
- Teu infinito sou eu, sou eu, sou eu, sou eu
No Corcovado, quem abre os braços, sou eu,
Copocabana esta semana, o mar, sou eu
e as borboletas do que fui pousam demais
por entre as flores do asfalto em que tu vais.


domingo, 23 de janeiro de 2011

Silêncio!

Se não sabe, não diga.
Fique quieto, não atormente
meu estado de espírito
com essa conversa prolixa.

Sem argumento, sem poesia.
Assuntos nulos e passageiros.
Como as voltas da polia.

Caio A. Leite - 23/01/2011

A Rosa-mor e a Flor Elis

No topo do muro de concreto
com raízes fixas e bem alinhadas.
Desabrocha, em pétalas vermelhas
com manchas alvas, a Rosa-Mor.
Flor símbolo de resistência
ao concreto que a aflige.
Aos passarinhos que lhe bicam.
Aos ventos que a trucidam.
Flor anti-chumbo, formosura
feminina que impede a morte
da esperança. Que sucede a
espécie. Que protege as mais
fracas flores. Os gerânios, as
violetas e a flor-de-lis.
É armadura contra
a opressão dos tempos mecânicos,
como o canto azul da Flor Elis.

Caio A. Leite - 23/01/2011

É segredo

Como definir o infinito? Para percebê-lo seria necessário ser infinito como o próprio objeto de estudo, ser tempo eterno. Como pode haver infinito se tudo começou um dia. Começou e chegou até hoje, até o agora em que escrevo e que já passou. Não há infinito, há o hoje com todas suas concessões. Pensar num futuro é prever o infinito, é chegar onde não se pode e nem se deve, querer tocar o infinito é tornar finito, logo já não poderia existir o que é inacabável.
Mas como por na minha própria cabeça que o amanhã jamais existiu. O amanhã é uma hipótese, um desejo, um querer poético de amar amanhã, de fazer amanhã, de deixar pra amanhã. Algo que não existe, como o infinito. Não há. Não existiu o dia depois, é sempre o dia antes. O ontem talvez, mas o que passou já é mito, já não se prova já se perdeu o que vale é agora, não o que se prevê.
Voltando ao infinito, de onde veio essa obsessão em traçar trajetória sem fim, sem começo, sem meio? Como se com esse preceito de infinidade, cria-se a fantasia de uma imortalidade humana em contos, em versos, em histórias. Mas não há o que se passa se perde e vira não-infinito, pois já é finito e acabado.
E não adianta buscar o pra sempre, não há saída. Mesmo que haja o eterno, a eternidade seria supostamente muito tempo. Tempo que faria as coisas passadas, tão herméticas em sua própria natureza se desmancharem em toda memória que busque aquilo que já foi, e que agora não é mais, pois já foste esquecido. Por outro lado, se houvesse um fim, uma linha de chegada, seria óbvia a destruição de tudo. E tudo se aniquilaria por conta própria nesse fim hipotético que transformaria qualquer lembrança em pó.
Só há que se parar de pensar no que se vai, no que se foi. Só existe um verbo que contemple as coisas com verdade. Há. E nada mais. Não houvera e nem haverá. O que é memória é soma de passados e tudo que é passado deixa de existir, pois assim dita as regras impostas. Não que o futuro não venha, pra alguém, pra alguma coisa, para um átomo perdido no universo infinito (?) ele virá. Mas só virá se existir protagonista pra esse futuro. Pois tempo sem ter onde atuar, já não é mais tempo, é só estagnação de existência. Tudo para e o tempo já não existe, logo não é mais infinito.
A única coisa que posso é parar de incluir tempo em filosofias, em teoremas, em dogmas. Todo contexto é passado e não mais existe, o que existe são suas sobras que vagaram nos hojes que vieram, mas jamais nos amanhãs que não existem.
O que é tempo, infinito, humano é teórico. E o que é sentimento vira teoria, pois é pensado, todo sentimento é teoria, quando vira ato já não é mais sentimento, é humano e racional, pois é bom. E o que vem pensado para ser, não pode ser sentimento, na verdade é o avesso disso. Sentimento vem sem pensar, mas quando já pensamos, não mais existe. Se acharmos que é amor, mesmo que antes fosse agora não é mais, pois já racionalizamos, e deixa de ser o que era.
Sendo inexistente a definição de infinito, logo o amor também não é. Talvez nem exista já que tem que ser oculto para ser, e se é oculto não podemos medi-lo.
O que é medido também vira humano, nada existe que não seja racional. Todo o resto é ficcional, só existe, pois podemos manipular a mente do que escrevemos. E ao filtrar esses pensamentos podemos tornar tudo sentimento, mas que evapora na leitura pensante que matematiquiza todas as possibilidades.
Não posso e nem devo ser a prova final do que digo. O que escrevo ponho pra fora e num ato de dor sem igual destruo a humanidade que há no que penso. Mas só será desumano e irracional enquanto documento secreto, guardado e sem análises. Pois do momento em que se lê, evapora-se todo trabalho de desumanizar as palavras, e tudo se torna óbvio e sem sentido. Para entender é preciso não ler, logo entender é individual. Mas mesmo que entenda não conte, não faça. Ao transpor a verdade em ato, ela deixa de existir e viver não faz mais sentido. O que faz sentido é saber e fingir não saber. É deixar que os outros descubram a grande verdade do infinito.


Caio A. Leite - 23/01/2011

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Sua luz da terra

Veja quanta luz a terra emana.
Em som, em véu de cachoeira.
Em aves e plumas, a hipercor.

E se há vida é com certeza
devido a sua alegria que
enverga toda vontade divina.

Não te ver mais triste,
não gelar, ouvir teu sorriso manso.
Animal das eras, doce selvagem.
Tua voz quimera!

Contar, voltar, vencer. Ser a luz da terra
que alumia tuas manhãs frias.
Ser você a minha rima de poesia.
Meu ode infinito. Meu soneto.
Minha redondilha.

21/01/2011 - Caio A. Leite

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O verde da manhã

Invento corda de atravessar,
invento paisagem de querer.
Possuo mente, demente,
sobre o leite que derrama
a fonte de vida, a luz exclama.

Reinvento verdades, minto.
Desfaço favores, cintos.
Cartas não recebo. Não abro.
Tenho medo de novo, do novo.
Das coisas que surgem.
Novas poesias virtuais.

Vou seguindo a cantar,
a absorver arte, como
a fotossíntese natural.
- Eu sou o verde da manhã.

19/01/2011 - Caio A. Leite